Existe uma fronteira onde a matéria se dissolve e dá lugar ao etéreo, onde a gravidade cede espaço ao desconhecido e o tempo se expande como uma constelação em movimento. É nessa fissura entre realidades que Lizzie Uamusse ergue sua exposição Entre Mundos: Ecos do Cosmos e Fluxos Celestiais, patente na Galeria Kulungwana.

Para além da fruição estética, a mostra propõe uma jornada emotiva e filosófica. Obras como Escadas Galácticas (110 x 110 cm) e Portal do Infinito (120 x 120 cm) não se restringem à superfície da tela, são chamados à travessia, ao desvanecimento das certezas e à reflexão sobre os próprios limites. Por meio de técnicas expressivas, jogos de cores e composições dinâmicas, Uamusse constrói narrativas de deslocamento, ascensão e transformação.

Trabalhando com óleo sobre tela, a artista explora sobreposições de tinta e traços vigorosos que conferem textura e energia às composições. A ausência de molduras reforça a ideia de continuidade, eliminando barreiras visuais e sugerindo expansão.

O cromatismo desempenha um papel central na construção dessas paisagens cósmicas. Em Escadas Galácticas, a interação entre amarelos radiantes, azuis elétricos e roxos intensos cria uma atmosfera instável, evocando tanto a ascensão quanto a incerteza do caminho. Já em Portal do Infinito, um círculo vibrante de cores sugere uma travessia para dimensões desconhecidas, onde a figura humana em sombra se vê diante da imensidão.

Neste contexto a cor vai além do decorativo, tornando-se não enredo visual: as transições entre tons sutis e quentes intensificam a sensação de movimento.

O gestual de Uamusse é enérgico e fluido, conferindo uma vitalidade quase cinética às formas. Em Portal do Infinito, a figura humana se apresenta como uma sombra prestes a se dissipar. Já em Escadas Galácticas, estruturas arquitetônicas flutuam no espaço, desafiando a gravidade e reforçando a sensação de deslocamento. A ambiguidade entre o definido e o etéreo transforma cada quadro em um instante de transição perpétua.

Embora fortemente ancorada no imaginário cósmico, a exposição dialoga com questões existenciais e sociais. As escadas indicam percursos individuais e colectivos, remetendo a jornadas de superação e identidade. O portal, por sua vez, retrata as escolhas, os limites da percepção e os desafios da travessia rumo ao desconhecido.
Nesse sentido, a obra de Uamusse reflete inquietações contemporâneas, tornando-se um espelho das incertezas e transformações que atravessamos.

A exposição se inscreve também em uma metáfora visual que ressoa com o conceito da Esfera de Dyson, uma estrutura hipotética proposta para capturar a energia das estrelas e expandir os limites da civilização humana.

Assim como a esfera ambiciona transcender as limitações da Terra, as obras de Uamusse buscam capturar a energia do cosmos, imergindo o espectador em um espaço onde as fronteiras entre o físico e o metafísico se diluem. Em Escadas Galácticas, a ascensão das estruturas flutuantes remete à tentativa de alcançar esferas superiores, enquanto Portal do Infinito sugere uma jornada através de dimensões inexploradas, refletindo o desejo humano de ultrapassar os limites conhecidos.

A tensão entre o tangível e o etéreo nas composições da artista ecoa a ideia de uma busca incessante pela evolução, assim como o conceito da Esfera de Dyson, um símbolo de superação dos limites impostos pela gravidade e pelo espaço-tempo. As obras de Uamusse se tornam, portanto, portais para uma compreensão expandida do cosmos, refletindo a nossa própria busca por transcendência.

A exposição Entre Mundos: Ecos do Cosmos e Fluxos Celestiais estará visível até o dia 4 de Abril, oferecendo aos espectadores a oportunidade de reflectir sobre sua própria jornada cósmica e os desafios das travessias humanas, em um espaço onde as certezas são dissolvidas e novas possibilidades se abrem a cada olhar.