“Artistas devem ter renda extra para não prostituírem a arte” – João Timane

A pintura é o caminho que João Timane encontrou para desenhar o rumo da sua vida. Apesar de ter crescido no Aeroporto, bairro periférico da cidade de Maputo, de onde dispoletaram vários nomes que se tornaram personagens com protagonismo na história das artes plásticas nacionais, diz que a arte simplesmente aconteceu-lhe.

De 2012 a esta parte, tem feito exposições individuais e particpado em colectivas, assim como tem emprestado o seu traço para algumas capas de livros. Para conhecê-lo na sua intimidade, fomos conversar com ele.  

“Comecei a desenhar ainda novinho, mas sem nenhum compromisso, fazia desenhos para oferecer aos meus vizinhos e amigos”, conta, com entusiamos e alguma saudade no olhar, João Timane.

Diz não ter memória ou consciência de nenhuma influência directa sobre a sua escolha pelas artes. Até porque, apesar de residir no mesmo bairro de um Malangatana, Gumatsy, entre outros, não os conhecia.

Notando o seu interesse e dedicação espontânea pelo desenho, seus primos Timóteo e Josué Bila decidiram encaminha-lo para a Escola Nacional de Arte, onde conta que ficou “muito surpreendido quando vi desenhos muito mais que perfeitos nas paredes e aí percebi que precisava desenvolver para chegar àquele nível”.

Porém, ninguém disse ao João que aquelas obras eram de alunos que já estavam a terminar o curso. Ele ficou a pensar que para ser admitido naquela instituição tinha que ter àquele nível de perfeição.

“Tranquei-me no quarto durante 30 dias desenhando e tentando aperfeiçoar os meus quadros, felizmente consegui ser admitido pela escola e foi assim que eu entrei para o mundo das artes”, conta Timane.

Artistas do quilate de Naguib e Chichorro o inspiraram. Viu neles as referências do que poderia se tornar. Em 2012, recorda, pintou “O primeiro passo”, na qual assume que “conhece as obras de Naguib pode perceber logo houve influência dele”.

A pintura, recorda João Timane, marcou-lhe muito pelo conceito que era algo sobre o facto de muitos jovens não terem espaço mesmo tendo ideias e projetos. Lamentava com a sua arte a ausência de financiamentos e de alternativas para realização de sonhos que acabam frustrados.

“Ali eu quis dizer que qualquer jovem sempre tem ideias e projetos que só precisam de um empurrãozinho para que possam progredir e ser alguém na vida e é essa mensagem que deixei ficar naquela obra”, detalha.

João Timane é um artista que sempre tentou trazer como mensagem à família. Por ter perdido os pais ainda na infância, sempre cobiçou os amigos passeando com os seus progenitores. Ao longe aprecia momentos agradáveis de convivio familiar. “Gosto de representá-los no meu trabalho”.

Os maiores desafios que se têm enfrentado na arte em Moçambique, está ligada à qualidade dos materiais de produção, uma vez que em concursos artísticos fora do país avalia-se também a qualidade do material.

“Já participei de um concurso em que perdi por conta do material que eu usava e estava para ganhar o terceiro lugar, só que no último dia tive a informação de que infelizmente o último júri apesar de ter gostado do meu quadro reprovou-me por conta do material usado”, partilhou João Timane.

Muitos artistas plásticos nacionais, observa, estão a desistir da arte e a agarrar outras áreas por estarem desamparados e pela falta de valorização da arte, mas acredita que os jovens ainda vão melhorar a situação dos artistas plásticos, uma vez que muitos deles já estão adquirindo a arte.

“Os que mais compram a arte cá são os estrangeiros, então nós estamos dependentes da política nacional, se continuarem a existir problemas políticos a arte será directamente influenciada”, acredita.

Tem a impressão de que os turistas não virão ao país enquanto persistirem instabilidades e automaticamente os artistas não vão vender, por esse motivo, defende que há que se promover a paz para que haja rendimento no sector.

João Timane partilhou que a sua admiração pelos artistas plásticos decorre em fases e que neste momento ele admira Vasco Manhiça, por ser um artista reservado e muito talentoso e o que o seu estilo de vida lhe lembra o seu antigo mestre e, quanto aos seus planos futuros, João Timane diz querer internacionalizar os seus trabalhos de modo que possa crescer como artista e chegar no nível dos grandes artistas que ele admira.

“Aconselho a todos que queiram entrar para o mundo da arte para que o façam com dedicação e que olhem para a pratica como o melhor professor e acima de tudo os artistas devem ter uma renda extra que é para não prostituírem a arte deles, no sentido de vender para poder colocar pão na mesa, porque se isso acontecer, o artista fará o que as pessoas gostam e não o que é a sua arte”.

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