A faceta do teatro e da telenovela na actualidade

O marco do início do teatro, no país, data desde à época colonial, tendo-se intensificado durante a Luta de Libertação Nacional, periodo em que foi utilizado como instrumento de protesto e de emancipação. Os primórdios desta arena cultural estiveram ao cargo do grupo Mapiko.
Com a evolução do tempo, novas formas de fazer teatro surgiram, junto de outros grupos; escolas foram abertas para melhor formarem indivíduos que desejassem aperfeiçoar o labor da representação. É disso exemplo é da Escola de Comunicação e Artes, da Universidade Eduardo Mondlane.
Foi nesta última instituição de ensino superior que Nélia Gilberto, Joana Mbalango e Paulo Jamine, conhecido por Lírico Poético, com quem conversamos para esta reportagem, aprofundaram o seu conhecimento sobre esta arte que, como amadores, já vinham fazendo.
No mundo a fora, são as novelas, as séries e o cinema, de modo geral, que têm ganhado muitas telas. Recentemente, de forma regular e duradoura, a telenovela chegou, também ao país, dando oportunidade a actores de diferentes quadrantes patentearem-se. O exemplo actual, desta forma de ficção, é “Maida”.
O teatro e à telenovela são interpretações diferentes. Basta observarmos que a actuação da primeira é feita ao vivo, no agora, para o público e, a segunda, sendo audiovisual, tem a possibilidade de repetir as cenas e falas até atingir o que o director pretende.
Lírico Poético se iniciou no teatro no Grupo de Teatro do Oprimido, actual Centro de Teatro do Oprimido. Fez parte do elenco de “Maida”, das séries “A infiltrada”, “Kuga Munu” e “Dê-me a sua mão”.

Na sua breve passagem pela telenovela "Maida", Lírico interpretou um juíz
Joana Mbanlango é a Sónia, vilã desta temporada de "Maida"


“Não existem mudanças no teatro e novela, porque tudo é representar e se deve representar bem”, diz-nos, porém assume que, para si, “a única diferença é que no teatro é aqui e na novela tudo se pode repetir num simples play.”
Já, Joana Mbalango, que iniciou a sua carreira como dançarina e embarcou para o teatro em 2017, admite haver alterações, que sentiu no seu papel na “Maida”. “É um desafio a transição de teatro para novela”, confessa.
Na sua experiência, o teatro é um processo muito demorado. Pode-se ensaiar por três meses, para apresentar em um dia. E o processo que acontece desde à criação da personagem até ao palco é colectivo. “Na novela não, o ensaio é individual”, descreve.
Para Nélia Gilberto, a telenovela veio para realizar o que sonhou quando mais nova, que era aparecer na televisão. Quando entrou para a Escola de Comunicação e Artes, a realidade de conciliar a teoria com a prática fê-la ver esta arte com outros olhos.
“Na novela nós aprendemos, principalmente quando saímos do teatro para fazer novela. Há sempre uma barreira, uma luta com o nosso Eu. O meu Eu sempre foi de ir mais além e a disciplina serviu para separar o teatro da novela”, diz-nos.
Quem consome os conteúdos, tanto do teatro, quanto da novela é o público, que não é homogéneo e, para os entrevistados a recepção da novela tem sido mínima, mas é no teatro sentem que a audiência é ainda mais fraca, apesar de já estar presente há vários anos no país.
“Precisamos muito de vender ou expandir o alcance das nossas peças. Se tivermos bons produtos artísticos o mercado irá crescer e aí são benefícios e garantias de trabalho ou sustentabilidade para o criador”, considera Lírico Poético.
A actriz Joana Mbalango começou a fazer teatro na igreja, nas peças do nascimento de Jesus Cristo e quando soube que se podia formar em teatro, abraçou a possibilidade e desejou crescer e saber mais.
Hoje, actriz de teatro e novela diz que o mercado está a crescer muito: “Estamos a ter muitas oportunidades de crescer, de mostrar o nosso potencial. Muitas vezes nós não conseguimos aquilo que queremos não por não ter uma oportunidade.”
O público da novela e do teatro é diferente, desligado um do outro. Quem o diz é Nélia Gilberto. Tendo já representado diversos papéis no teatro e participado, como vilã, na mini série “Coisas de família”, afirma que falta, na sociedade moçambicana, a cultura de ir ao teatro.
“Quem vejo na plateia são os nossos amigos, amigos dos nossos amigos ou pessoas ligadas ao teatro. O ciclo é o mesmo de amizade”, diz ainda que, na novela o cenário é diferente, pois “muita gente está a ver, talvez por ser televisão, ser acessível e fácil de aceder em casa com a família, do que sair e ver teatro.”
Tanto para Nélia, Joana e Lírico, as duas áreas de manifestação artística são desafiadoras, principalmente no contexto moçambicano, mas reconhecem haver mudanças, pois, o público vai-se habituando a consumir os conteúdos nacionais.
Agora, porque os três iniciaram, antes no teatro, perguntados sobre o seu lugar de preferência, Lírico assume preferir o teatro, pois “fazer teatro é viver a vida, é onde posso reconstruir ou recriar o meu mundo da forma mais simples e clara na percepção de vários problemas na sociedade.”
Nélia vai na mesma direcção que a do seu colega. Para si, “não existe melhor coisa que estar no palco, poder sentir a atmosfera daquele lugar, tudo se junta e transforma o actor, o teatro é mágico, é transformador”.
Para mais, na sua descriação o teatro é a zona do desconforto, pois exige muito trabalho, “é difícil, é trabalhar duro”, que é, aliás, o que se encaixa no seu perfil. Não por acaso disse-nos que “não gosto de coisas fáceis”.
Joana Mbalango confessa estar em descoberta, mas que é no teatro onde se descobre mais. “É algo mágico, extraordinário, fenomenal”. E a razão é, como nos conta, “porque não é só fazer, para mim não é só um faz de conta, é uma série de processos que estão envolvidos”.
Exercícios tais, prossegue, que acabam de certa forma mexendo com o seu psicológico, com aquilo que é o seu ser, “aquilo que eu sou de verdade.”

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