Pedro Baltazar reafirma o fascínio pelos rios em “55 Rios”

Uma mesa de madeira na entrada do Centro Cultural Brasil Moçambique, em Maputo, dava-nos as boas vindas. Reluzente e, aparentemente, recém vernizada, a mesa tinha, sobre ela, os “55 Rios”, segunda obra de Pedro Baltazar, perfilados com rigor, a lembrar o caudal de um grande rio.

Enquanto isso, a sala onde acontecia o lançamento estava fria e o ar que circulava no interior interior do Auditório Vinícius Morais era distribuído pela aba de um Ar condicionado programado para contrariar o calor que se fazia sentir no lado de fora.

A cerimónia começou com música. Com sua voz e guitarra o intérprete Will Acústico trouxe o músico Dimas de volta a vida. Cantou “Hlomulo”, uma música de intervenção social que corresponde a um grito pelo fim da pobreza e injustiças sociais, temáticas também presentes em “55 Rios”.

Seguiu-se o momento de leitura do livro. Eduardo Quive se fez ao púlpito para dar a conhecer parte daquilo que a leitura de “55 Rios” proporciona. Começou por considerar Pedro Baltazar um poeta que deixou-se amadurecer, na medida em que, considera, o autor teve coragem e ousadia de lançar mais um livro, consolidando um percurso literário iniciado ano passado, com “O Parto dos Rios”.

O olhar sereno e a voz cuidada, Eduardo Quive viajou pelos “55 Rios”, indo parar à foz do Rovuma, onde está “O Patriota”. Além do “Rovuma”, a obra é composta por outros dois cadernos, Maputo e Zambeze, em representação aos grandes rios de Moçambique.

Declamou com ímpeto, o poema que ironiza o comportamento dos cidadãos que se dizem patriotas, mas, na verdade, perseguem interesses pessoais, ao ponto de afundar toda uma sociedade na vulnerabilidade. O texto é rico em figuras de estilo, a denunciar, expor e, ainda, a lamentar as nuances que envolvem situações quotidianas.

A declamação foi ouvida e sentida pelo público que (cor)respondeu com aplausos, em reacção à forma crua, por vezes fria, com que Pedro Baltazar questiona, indignado, sobre os problemas que enfermam a sociedade moçambicana.

A apresentação da obra esteve a cargo de Armando Jorge Lopes. Para o professor catedrático, a escrita de Pedro Baltazar apresenta traços que se assemelham aos de José Craveirinha.

“Quase que diria que Pedro Baltazar vai buscar muito do seu erotismo, tanto nos poemas anteriores como em muitos outros, a Craveirinha, dando-lhe forma, é claro, à sua maneira.”, descreve, a acrescentar que Pedro Baltazar é um poeta interventivo e que se assume como alguém que se levanta contra todo e qualquer tipo de injustiças.

“A cultura é um todo que inclui o conhecimento, a linguagem, as crenças, as percepções, as atitudes, os valores como a dignidade humana, a igualdade e a justiça, e inclui ainda a arte, a moral, a lei, os costumes e outras capacidades que o ser humano adquire como membro de uma sociedade. E tudo isso reconheço no Pedro, na pessoa que conheço, como profissional com que trabalhei e poeta!”, refere.

Não espero que me ofereçam prendas

Em “55 Rios”, Pedro Baltazar reafirma o seu fascínio pelos rios. Tal como fez n’O Parto dos Rios”, sua obra de estreia, o autor partilha andanças pelos caudais dos maiores de Moçambique e não só, mas também apresenta o resultado de uma viagem do eu poético para dentro de si e dos outros.

De acordo com o autor, “55 Rios” é, também, uma homenagem. “O número 55 não é escolhido à toa. Ele assinala 55 rosas primaveris que já colhi na minha vida”, avança o autor, a completar que “não espero que me ofereçam prendas. Ofereço-me a mim mesmo algumas prendas, como esta”.

A poesia de Pedro Baltazar mistura a linguagem forma e informal. Recorre, muitas vezes, à gíria popular, o que aproxima o poeta da realidade onde se encontra inserido.

“Se calhar vocês não se apercebem, mas nós vivemos atravessando rios. Temos sempre algum rio que é uma referência para nós” avança, a destacar que “o rio representa a mãe das mães”.

Os cadernos aqui presentes, continua o autor, são uma prova de que Moçambique um todo integrado e indivisível. “A tal unidade nacional de que se fala significa que somos, todos, moçambicanos, apesar das diferenças. Escrevi este livro sobretudo para os mais novos, para que tenham um referencial”, finaliza.

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