O nó do destino

Escrito por Edson Manguene
Uma noite cinzenta. É junho e esta frio, com uma neblina que remete a nostalgia de um passado bom com muita efemeridade e inocência dos tempos que não demoram descolorir, embalo me nos meus pensamentos estoicos, distante do whatsapp e dos facebooks da vida, não quero estar preso a nenhum algoritmo. Ensolo-me! Tomo um café e vem-me memórias do meu falecido que me deixara como herança uma velha máquina de escrever. Começo a redigir qualquer lembrança que me vem a mente, são 4horas da matina e nem o galo cantou. É junho, deve estar a sentir frio.

Espreito pela janela e vejo alguns vizinhos, tiro os meus auriculares e ouço um barulho. Sem pensar, abro a porta às pressas para perceber o que estava a acontecer e deparo-me com um cenário infeliz e melancólico que remete a um passado cheio de ausências.

-Lembras de Johane? (pergunta-me a vizinha da casa ao lado).
-Sim, respondo rápido enquanto penso.

Puxo a minha memória e me aparece a imagem de um vizinho esquisito que desaparecera ha alguns anos. Vivia em um bulício constante, sorria apenas por obséquio e via se uma melancolia profunda no seu olhar.
Já estava a viajar, mas volto-me para a vizinha, quero entender o que está a acontecer da zona.

A dona Sina, toda eufórica e nervosa, começa a explicar o real motivo da agitação:
-Ele veio, entrou em transe em frente à minha porta, gritava e chorava como um animal abandonado e até fiquei com medo, da janela comecei a orar e a gritar. Por pouco entrava em transe e o meu filho apareceu e juntos saímos quando o barulho reduziu, e alguns vizinhos também começaram a aparecer com o clarear do dia cinzento. O rui teve coragem, aproximou e identificou o rosto dele.

É o Johane que vivia ali na casa abandonada. Desapareceu há 15 anos e a maioria das pessoas esqueceu a sua existência , ninguém mais lembrava e ninguém saberá por onde ele andara, alguns até pensavam que tinha morrido, outros diziam que o mar lhe tinha levado e que os antepassados dele estariam a preparar-lhe para ser um salvador da pátria.

A casa onde ele vivia ficou abandonada, ninguém tinha coragem de entrar e la já não era seguro e não tinha subsistência, as autoridades municipais aproximaram e cortaram todas arvores que lá existiam.

Estava com um semblante fantasmagórico e cheio de melancolia e servira de refúgio para alguns animais. Muitos tinham medo de entrar, alguns diziam que o fantasma do Johane vivia ali e de noite gritava como um grilo insatisfeito e inconformado com a vida subterrânea.

Johane sempre foi uma pessoa diferente, de poucas falas e cheio de ausência. Passava maior parte do tempo sozinho e uns diziam que era solitário e tinha espíritos dos antepassados. Para mim, ele apenas viveu em solitude como um estóico.

Ninguém nunca soube o certo acerca das suas origens, dele apenas haviam mitos, alguns diziam uma determinada história de como ele apareceu na zona, mas ninguém sabe o certo, apenas o velho Dom Macha, que morreu a pouco tempo. É uma tristeza e tanto que ele deixou nos nossos corações. Dom Macha foi um verdadeiro estóico.
Dom Macha costumava dizer que Johane era um génio e só precisava estar no lugar certo onde pudesse exprimir sua arte e invocar os seus antepassados sem infortúnios.

Vejo o Johane no chão a salivar e a gritar, aproximo e uso alguns dotes de hipnose que aprendera nesses livros de Freud.

Ele respondeu como um bebé que diz as primeiras palavras na vida:

-Árvore ,raiz, canhú, vida…
-O que queres dizer, Johane? Fala…

As pessoas murmuravam dizendo que ele está louco.
-Essa árvore que cortaram era o embondeiro onde a minha família realizava o culto,(ele continua a falar quase que nada se escuta).

Ele desmaia sem terminar o que tinha a dizer…

A dona Tina disponibiliza-se a leva-lo ao hospital, e eu vou junto,quero ouvir o que ele tem a dizer…

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