Mia Couto prestigiado pelo Prémio José Craveirinha

Mia Couto prestigiado pelo Prémio literário carreira José Craveirinha, 2022, pelo seu percurso ao longo do qual já publicou poemas, crónicas, contos, infantojuvenis, romances e ensaios.
Anunciado na tarde de hoje, na Sala Nobre do Conselho Municipal de Maputo, esta premiação decorre neste ano particular, em que se celebra o centenário do nascimento do poeta-mor.
O autor da trilogia “As areias do imperador”, que sintetizou José Craveirinha como o poeta, escritor, e cidadão moçambicano de quem “a poesia é a sua nacionalidade, a língua a sua morada e Moçambique o seu estado civil”, aquando da atribuição do Prémio Camões, construiu “pluriversos” cujas matrizes são a diversidade que configuram o nosso país.
Do livro de poemas “Raízes de Orvalho”, publicado em 1983, que foi o culminar de publicações que vinha fazendo no jornal Notícias da Beira desde 1971, a esta parte, numa das suas fazes, a dos neologismos, apropriou-se na construção morfológica de algumas línguas nacionais para criar palavras novas em português.
Ainda nessa primeira publicação já se explorava no fantástico, lirismo, além da musicalidade que revelava o olhar de um escritor critico aos problemas sociais e preocupado com questões de memória e identidade de um país recém-independente, submerso no esvaziar da utopia socialista, corrente na qual também acreditou e a qual se dedicou na juventude.
A guerra dos 16 anos que devastou o país, despedaçou o tecido social e a esperança do seu fim, fez as imagens e o imaginário do autor na sua estreia na prosa, através do livro de contos “Vozes Anoitecidas”, em 1987.
Quando lançou “Terra Sonâmbula”, em 1992, seu primeiro romance, pouco depois viu esse livro considerado um dos doze melhores livros africanos do século XX por um júri criado pela Feira do Livro do Zimbábue. A temática memória volta a estar presente nos flashbacks nos “cadernos de Kindzu”, encontrado por Muidinga, rapaz protagonista, que é conduzido pelo velho Tuahir que o resgatou ao lado de machimbombo queimado, outra sequela da guerra de desestabilização.
Em 1989, com o livro de crónicas “Cronicando”, venceu o Prémio Anual de Jornalismo Areosa Pena, atribuído pela Organização dos Jornalistas Moçambicanos (actual Sindicado Nacional de Jornalistas). Os embaraços de uma sociedade que, no período colonial viveu na periferia, e pós-independência, com as nacionalizações passa a residir no centro urbano. Uma das crónicas míticas desse livro é “Um pilão no nono andar”.
“Vinte e zinco”, em 1999, amplia a obra de Mia Couto para a novela na qual, se quisermos obedecer o vocabulário marxista-leninista, temos dois extractos sociais, o proletariado (moçambicanos colonizados) e a burguesia (portugueses colonos). O racismo e outras paranoias dão corpo ao enredo.
Os textos de intervenção que foi escrevendo para apresentar publicamente em colóquios, seminários e afins, deram origem ao livro de ensaios “Pensatempos” em 2005 e outro, “E se Obama fosse africano?” em 2009.
Outro momento importante desta carreira composta por sucessivas superações, foi o lançamento, em 2015 do primeiro livro da trilogia “As areais do imperador” composta pelos romances “As mulheres de cinza” (2015), “A espada e azagaia” (2016), “Bebedor de horizontes” (2017). Imane, uma mulher Xicopi, nos introduz ao meio social e político de Ngungunhane, o último imperador de Gaza.
A este percurso se acresce o contributo de Mia Couto para o Teatro, na emblemática Mutumbela Gogo, que quando foi criado em 1986, preocupada com a escassez de textos dramáticos moçambicanos, o convidou a escrever algumas peças.
Outrossim é que alguns dos seus livros foram transformados em filmes, como é o caso de “O último voo do flamingo”, adaptado por João Ribeiro, “Um rio”, do realizador português José Carlos Oliveira, baseado na obra literária “Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra” ou “O ancoradouro do tempo”, uma longa-metragem adaptada do livro “A varanda do Frangipani”, realizada por Sol de Carvalho.

Mia Couto nasceu em 1955 na cidade da Beira, província de Sofala. Viveu nessa cidade até aos 17 anos, altura em que foi para Lourenço Marques para estudar Medicina. Interrompeu o curso para iniciar uma carreira jornalística que se prolongou até 1985.
Por sua iniciativa regressou à Universidade para estudar Biologia tendo terminado o curso em 1989. Até à data trabalha como biólogo em Moçambique.

Publicou mais de 30 livros que estão traduzidos e editados em trinta diferentes países. Os seus livros cobrem diversos géneros desde o romance, à poesia, desde os contos ao livro infantil.

Recebeu dezenas de prémios na sua carreira, incluindo – por duas vezes – o Prémio Nacional de Literatura, o prémio Camões e o prémio Neustad, considerado o prémio Nobel norte-americano.

No ano de 2016 foi finalista de um dos mais prestigiados galardões internacionais, o Man Booker Price. O seu romance Terra Sonâmbula foi considerado por um júri internacional reunido no Zimbabwe como um dos 10 melhores livros africanos do Século Vinte.

É membro da Academia Brasileira de Letras. No ano de 2020, com a trilogia “As areias do Imperado”, ganhou internacionalmente o prestigiado Prémio de Literatura Jan Michalski.

Em Janeiro de 2021, também com a trilogia “As areias do Imperador”, foi galardoado em França com o Prémio Albert Bernard.

Organizado pela Associação dos Escritores Moçambicanos (AEMO), em parceria com a Hidroeléctrica da Cahora Bassa (HCB), o maior galardão literário nacional premeia a carreira e o percurso de um autor moçambicano, como forma de reconhecer a importância da sua obra em prol da arte e da cultura moçambicanas.

O presidente do júri da edição 2022 do Prémio de Literatura José Craveirinha foi o escritor e ensaísta Luís Cezerilo, numa equipa composta igualmente por Sara Jona Laisse, Manuel Tomé e Bwana Yesu.

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