Magafusso expõe as suas inquietudes na Fundação Fernando Leite Couto

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Cheias (2020) Oleo sobre tela 100x75 cm

Semblantes melancólicos, composições de rostos da época malangataninana e sequelas do cubismo nutrem a exposição “Três dedos e três cores”, de Magafusso nome de assinatura nas telas de Diogo Luís Daniel, a inaugurar amanhã às 18.00 horas na Fundação Fernando Leite Couto.
Com a inauguração aberta ao público, entre telas maiores e menores, o artista nascido em Inhambane e lá residente, mostra obras compostas por corpos deformados e faces reveladoras de pensamentos nostálgicos.
Os objectos, regra geral são transparentes e sobrepostos, assim como, nalguns casos, no abstracto tem-se a mesma sensação em relação as cores, recurso que Magafusso diz ter ido buscar ao cubismo, na fase em que Picasso virou-se para a arte africana.
Justifica que as cabeças inclinadas para baixo, denominador comum, é uma técnica que desenvolveu para se distinguir de outros traços, para integrar ao vocabulário que pretende marcar a sua singularidade enquanto artista.
“É o meu carácter, assim como os três dedos nas mãos e nos pés, é o meu jeito de pintar”, explicou, a esclarecer igualmente que “as cabeças viradas para baixo representam sentimentos de alguma tristeza”.
O azul, uma das cores mais presentes, pode ser interpretada, por quem vê, a partir do facto ocasional da geografia do seu nascimento e residência, que é Maxixe, na costa da província de Inhambane, onde impera o oceano Índico.
Para Magafusso, entretanto, “o azul significa eternidade, o além, para lá de onde o olhar pode alcançar. O céu e o mar não terminam onde vemos, ali é apenas o nosso limite. Queria com isto convidar a uma interpretação mais profunda da minha obra”.
Esse artista plástico, observa Jorge Ferrão, que assina o texto do catálogo da exposição “Três dedos e três cores”, encontrou as suas próprias formas de filosofar a nação, colocando, amiúde, as vicissitudes como mote maior da criatividade. Sabe bem, com todas as letras do seu alfabeto artístico, que faz parte da responsabilidade dos intelectuais e criativos das artes, pensar, reflectir e participar, sempre que possível, na redefinição da construção deste país e desta nação.
Ferrão descreve que o Magafusso usa as artes e telas, como terapia e balsamo para minimizar a dor do drama, do conflito de morte e da tragedia, e maximiza a esperança de um novo dia, de um amanhecer mais colorido e de um sol que ilumina a todos com a mesma tonalidade e indisfarçável arco-íris.
“Conhecido por muitos e referenciado pelos colegas como ‘’talento lapidado’’, Magafusso retoma as consequências, as perplexidades e o estado de aporias de um Moçambique contemporâneo, com limitados e intermitentes períodos de paz, impregnado nas telas as cores monótonas e pálidas, que reabrem as feridas de uma nação que almeja uma identidade sonhada de prosperidade e reinventa uma reconciliação através de uma linguagem paradoxal”, lê-se no texto de Jorge Ferrão.
Apesar deste artista, comenta o autor do texto, não convivido com Malangatana, porém que retira do “Pai da pintura moçambicana”, o pendor de uma marca firme e lustrosa, enquanto bebe dos restantes o realismo, abstratismo e o nudismo de um povo que se quer indumentar e desfaz os caminhos desses reencontros.
Magafusso pinta desde 1983, como resultado da sua inspiração e da vontade de conferir a este país a meritocracia da arte, a sagacidade da cor e dessa veia genética de seus pais, devotos, religiosos e amantes de cultura.

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É licenciado em Jornalismo, pela ESJ. Tem interesse de pesquisa no campo das artes, identidade e cultura, tendo já publicado no país e em Portugal os artigos “Ingredientes do cocktail de uma revolução estética” e “José Craveirinha e o Renascimento Negro de Harlem”. É membro da plataforma Mbenga Artes e Reflexões, desde 2014, foi jornalista na página cultural do Jornal Notícias (2016-2020) e um dos apresentadores do programa Conversas ao Meio Dia, docente de Jornalismo. Durante a formação foi monitor do Msc Isaías Fuel nas cadeiras de Jornalismo Especializado e Teorias da Comunicação. Na adolescência fez rádio, tendo sido apresentador do programa Mundo Sem Segredos, no Emissor Provincial da Rádio Moçambique de Inhambane. Fez um estágio na secção de cultura da RTP em Lisboa sob coordenação de Teresa Nicolau. Além de matérias jornalísticas, tem assinado crónicas, crítica literária, alguma dispersa de cinema e música. Escreve contos. Foi Gestor de Comunicação da Fundação Fernando Leite Couto. E actualmente, é Gestor Cultural do Centro Cultural Moçambicano-Alemão

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