Ralharam-se os escritores, adiaram-se as eleições

O dia das eleições, sábado (05), na Associação de Escritores Moçambicanos (AEMO), em Maputo, terminou como começou. Sem novo Secretário-Geral e com as tensões e os nervos à flor da pele entre os membros, sem consensos, sem avanços e muita discórdia no seio dos cultivadores da palavra!
Aliás, consenso até houve. A única decisão conjunta, que não levou os escritores à clivagens, muito menos à consultas aos contraditórios e desactualizados regulamentos e estatutos da AEMO, foi a da realização da Assembleia-Geral Ordinária debaixo das copas das perenes mangueiras no fundo da casa, em vez da sala preparada para o efeito.
Neste quesito, os jovens e velhos da AEMO deram uma aula de associativismo. Trabalharam juntos e a todo o vapor, carregando cadeiras, mesas e outros materiais, na montagem do novo palco da reunião.
Feitos os últimos acertos, todos tomaram os respectivos acentos e estava tudo pronto.
O ar estava fresco, mas o ambiente era tenso, agitado por fervurosas intervenções dos membros. As emoções indisfarçáveis tomavam conta dos escritores presentes, expectativas em alta. Não podia ser diferente: a sessão foi marcada por barulhos e reclamações de início ao fim.
Começou por um acto solene, digno de uma agremiação guiada por valores e princípios sociais. Um minuto de silêncio em homenagem a Calane da Silva, Marcelino dos Santos e outros Homens das letras que pereceram nos últimos três anos, alguns por conta da pandemia do novo coronavírus, deixando um enorme legado.
Logo seguiu-se o espectáculo da orquestra liderada pelo Presidente da Mesa de Assembleia, o escritor Filimone Meigos. As notas prévias já prenunciavam que não seria um dia fácil, a julgar pela reacção dos associados que, logo de início, reclamavam clareza em todo o processo.
Reclamação justa. Ao dia das eleições, não se sabia quem devia escrever a acta da reunião, nem mesmo o auxiliar de Filimone Meigos na Assembleia Geral Ordinária que precedeu o escrutínio.
E não é o pior. Houve espaço para um episódio de atraso tipicamente moçambicano. Carlos Paradona, que concorre a sua própria sucessão no cargo de Secretário-Geral da agremiação, chegou tarde à Assembleia, sob a justificativa de não ter podido fazer a impressão de documentos importantes para a ocasião, por falta de energia elétrica. Coisas da nossa pérola do índico.
De seguida, emergiu das suas mãos um envelope, de onde retirou um leque de papéis em torno dos quais se haveria de debater os assuntos relativos à vida da Associação, em busca da concordia que conduziria a um processo eleitoral que nem veio a acontecer.
Leu o Relatório de Actividades e Contas do seu mandato (2018-21), que a propósito devia ter estado em posse de todos pelo menos oito dias antes da reunião, e lançou uma nuvem de dúvidas no repertório.
Vozes levantaram, em coro, em contestação pelo facto de (supostamente) o documento ter omitido alguns aspectos negativos ocorridos durante a última liderança na AEMO.
Paradona fez magia e ainda retirou do mesmo envelope o Parecer do Conselho Fiscal sobre o primeiro documento. Uma autêntica, nua e crua inconstitucionalidade à céu aberto que não passou despercebida pelos presentes.
Pelo facto e, ainda, por alegar que não fez parte da elaboração do documento em epígrafe, Nelson Lineu, 1º Vogal e único representante do Conselho Fiscal, representado pelo Prêmio Camões 2021, Paulina Chiziane, recusou-se a ler.
Daí nasceu mais uma discussão, sobre a validade ou não do documento e, com isso, se se podia proceder com a leitura. Como era de esperar, depois de uma longa discussão, finalmente foi ouvida leitura do relatório. E assim se foi, até uma pausa para o lanche.
Na volta do intervalo, mais faíscas. É que foram admitidos, há três dias, mais 40 autores e amantes da literatura à AEMO. Podem ou não votar? Os estatutos, Paradona e os próprios novos integrantes dizem que sim, mas as tradições da casa dizem que não. E foi o não que prevaleceu, até ao adiamento das eleições para uma data por anunciar.

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