2022, CENTENÁRIOS IMPORTANTES

Por
Álvaro Carmo Vaz, Janeiro de 2022

Em Moçambique, passam os centenários de dois dos nossos mais importantes poetas, José Craveirinha e Reinaldo Ferreira. Craveirinha, consagrado como herói nacional, infelizmente mais falado do que lido, será certamente devidamente comemorado, o Estado não irá eximir-se a essa responsabilidade e a família não deixará de o fazer lembrar. Eu preferia que se aproveitasse a ocasião para relançar o trabalho de pesquisa sobre o baú de manuscritos que ele deixou e que a família deixasse de ser a força de bloqueio que tem sido em relação a tentativas anteriores (Fátima Mendonça, FBLP), que se avançasse com uma boa antologia (estava a lembrar-me de duas excelentes antologias, ambas com a mão de Pedro Mexia: a de Rui Knopfli, “Nada tem já encanto”, e a acabada de sair, de João Pedro Grabato Dias, “Odes didáticas”), que se fizessem seminários para debater a sua obra publicada, incluindo os livros mais recentes, os belíssimos (embora nada heroicos) “Maria” e “Poemas eróticos”. Mas palpita-me que o Estado e família vão preferir algo mais inaugurável como uma estátua*.
E quem vai recordar e celebrar publicamente Reinaldo Ferreira? Um poeta que produziu poesia de alta qualidade, que morreu cedo sem ter livro publicado, que apenas não desapareceu de todo porque um pequeno grupo de amigos seus (Vítor Evaristo, Eugénio Lisboa, outros dois de cujos nomes não me recordo) assumiu a tarefa de reunir os papéis que Reinaldo deixou e publicar o seu único livro, “Poemas” – que, hoje em dia, não se encontra à venda em lado nenhum. Não seria possível que a algum dos nossos editores lhe desse um golpe de asa e arranjasse forma de fazer uma nova edição? Porque deixar passar este centenário em branco será um crime contra a cultura moçambicana.
Também o grande José Saramago faria cem anos neste ano, os portugueses vão por certo celebrá-lo condignamente, a Pilar e a Porto Editora vão zelar por isso. E fazem bem, é importante que mais gente não se limite a saber que Saramago foi, até hoje, o único escritor português a ganhar o Nobel de Literatura mas que leia os seus grandes romances, o “Levantado do chão”, o “Memorial do convento”, “O ano da morte de Ricardo Reis”, o “Ensaio sobre a cegueira”.
* Informaram-me que vão-se fazer algumas valiosas iniciativas culturais, com envolvimento da família Craveirinha.

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