Três décadas intensas [50, 60 e 70] do século XX

Semanalmente, através do programa Conversa ao meio dia, produzido pela Plataforma Mbenga Artes e Reflexões e transmitida pela Rádio Cidade, contamos alguns episódios da História das Artes Plásticas moçambicanas, na rubrica Restauro.

Concebemos este espaço no nosso portal para a partilha, em forma escrita, do conteúdo breve, transmitido na rubrica supracitada.

Em tempos de crise, de colisão de pensamentos, de questionamentos políticos e sociais. Em tempos de repressão, de demonstração brutal de força por parte do aparelho governativo de um território a arte tende a ganhar.

A força do Renascimento Negro de Harlem (EUA) continuado pela Negritude (França) que gera o pan-africanismo, é disso prova. A poesia de Langston Huges, Jean Toomer ou Claud Mckay a par do Swing que vibrava o subúrbio nova-iorquino dos anos 20/30 do século passado são disso prova.

Moçambique não é alheio a essa realidade. Quando nos referimos aos anos 50, 60, 70 estamos a falar da estilização da marrabenta, de uma literatura consciente do seu momento (contexto) e missão histórica. É ainda nessa altura que o continente desperta para a necessidade de acabar com o colonialismo a qualquer custo.

Como já tínhamos escrito na semana passada, Malangatana que surge e se notabiliza nesse período, representa uma ruptura. Este resignifica o pictórico moderno ocidental que se tornava dominante em Moçambique ao introduzir uma nova linguagem, seguida por outros artistas negros moçambicanos.

É neste contexto que entra em cena Shikani, escultor que frequentou o curso de escultura no Núcleo de Arte. Na sequência emerge Chissano a esculpir madeira e a expor o seu trabalho colectivamente e individualmente.

De acordo com a historiadora Alda Costa, no livro “Arte e Artistas em Moçambique diferentes gerações e modernidades”, em 1966 Chissano expunha no Salão de Arte Moderna em Maputo, numa altura em que o artista Jorge Nhaca, que ficou conhecido por recorrer a técnica de pirogravura.

Enquanto Malangatana assume protagonismo na pintura, Chissano toma essa posição na escultura, sendo inclusive premiado. Chissano realizou uma exposição individual no Salão da Coop, espaço que, conforme Alda Costa, desde a inauguração privilegiou a arte dos moçambicanos.

As obras de Chissano são aclamadas pela crítica da época, que as descreve como complexas e transportadoras do que via e sentia. Ainda iremos dedicar um artigo especial para Chissano.

Na mesma época, Inácio Matsinhe, Zito Craveirinha, José Caveirinha Júnior, João Caveirinha, então estudantes da Escola Industrial, igualmente abraçam as artes, nas associações que surgiam na cidade de Maputo.

Roberto Chichoro, segundo Alda Costa, outro estudante da Escola Industrial, realizou a sua primeira exposição em 1965. Hão de ter alimentado este momento o Núcleo de Arte, o Salão de Arte Moderna, entre outros espaços.

Em 1970, a Galeria da Coop volta a acolher Chissano para uma exposição, mas desta vez com dois discípulos, Adriano Mazive e Mundau Oblino. Seguiram-se os escultores e pintores Paulo Come, Naftal Langa, Inácio Matsinhe, Samate Mlungo Machava, Mankew Mahumana, Fernando Machiana, Zabela (como era tratada Isabel Martins), Noel Langa, entre outros.

As décadas 50, 60 e 70, estão ainda marcadas pelo aparecimento de artistas mestiços no nosso panorama. O historiador António Sopa, no seu artigo contextualizador, intitulado Artes Plásticas em Moçambique – Um percurso de 100 anos, aponta que Luís Polanah, mestiço que começou a pintar na década 40, reflecte já novas técnicas e correntes artísticas.

Sopa acredita que a actividade de dirigente da Associação Africana de Lourenço Marques terá influenciado a pintura de Luís Polanah que, em 1959, foi estudar Belas-Artes em Portugal.

Bertina Lopes encarada como mãe da Arte Moderna moçambicana, na óptica do historiador, é outro exemplo da entrada de mestiços na cena artística moçambicana. O contributo da pintora e poeta passa pela introdução de novos valores e estéticas na cena nacional, tendo influenciado inclusive Malangatana. Bem integrada na sociedade colonial e casada com o jornalista e poeta Virgílio de Lemos, Bertina circulou literalmente os dois mundos (colonos vs colonizados).

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