Não há lero com Jack Daniel’s

Os bares e as barracas estão cheios de saudade. Os homens estão vazios de bar e barracas. De ver o carrancudo na terceira cerveja a libertar um riso que, na melhor das hipóteses, permanece intacto com o indivíduo estendido onde der para se encostar. Nunca chega a oitava cerveja.

Antes da queda, porém, habitualmente vertiginosa, liberta os seus versos favoritos, numa bela voz, um tenor que agarra pela surpresa de, repentinamente, o bar ser tomado por um gajo com uma viola sob o colo, que canta: buquês são flores mortas/ num lindo arranjo (arranjo lindo) / feitas para você, do Milton Nascimento.

Victor, semblante amarrotado, pousa os cotovelos no balcão, encaixa o rosto entre as palmas das mãos que formam um V onde acomoda o queixo. – Estamos fudidos! Vê o futuro a apresentar-se num vulto veloz, que dança ao passo da ironia das incertezas.

“Não precisa morrer para ver Deus” – canta Milton Nascimento e a sua voz liberta-se através do sound-bar JBL, que obedece a um repertório do Deezer. Victor nem consegue caminhar para o espaço contíguo ao seu bar, que recentemente alugara para receber mais gente, distanciada. – Estamos fudidos!

Na avenida 24 de Julho, o Marcelo a procura de uma Bottle Store, desesperado, às 12.50, só sente o ar a cortar com as indianas preto, branco, vermelho, nalgum ponto verde. Do passeio sente a brisa no rosto, que desenha a curva da barriga, quando a camiseta cede ao leve vento que sopra. A frota é enorme. Persegue com os olhos.

Bottle Store à vista! Zás, o gajo corre, três passos mal e consegue respirar. O cigarro lixou-lhe a caixa. Arrasta-se. Vê o guarda a segurar na grade com a mão direita e na esquerda o cadeado. Dobrado, com as palmas das mãos nos joelhos, a escassos metros, ainda liberta um: espera Boss.

O senhor gordo, barriga grande, que enverga uniforme de calças castanhas, camisa azul oceano e botas pretas com atadores verdes, não está a tratar. Ergueu-se na grade: se faz favor, peço uma Jack Daniel’s. – Estamos encerrados, senhor. Volta amanhã, às 8.00. Fecham-lhe a porta na cara. Cabam! Inconformado. Derrotado, na verdade. Recupera o fôlego, ergue-se novamente e na sua frente, na avenida, uma dúvida se instala: terá a Handling trocado de veículos? Terá, devido a crise, abdicado dos camiões pelas indianas preto, branco e vermelho, nalgum ponto verde: Txilar, 2M, Heineken, Manica, Jameson, Jack Daniel’s, Amarula, Escape, 1818, Tipo Tinto, Monte Velho, aquele vinho verde, a transbordar. O relógio marca 13.5h.

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