Os fantasmas por trás das cortinas

Por: Pedro Pereira Lopes

Vivia, numa aldeia, uma mulher muito rica. Como não conseguia conceber, abandonavam-na os esposos por senhoras férteis. Com o tempo e conforme ia ganhando rugas mais grossas, fez-se ela tão sovina, que lhe era impossível até o convívio familiar. Tinham-se-lhe empedrado o coração, a alma e o sorriso. Curiosamente, a mulher amava, em bastante segredo, uma sobrinha sua, que era órfã, ao ponto de achar que a menina era a sua última vontade de vida. A rapariga retribuía-lhe o amor, e tão doce que era, não entendia a aversão que pela mulher nutriam os outros parentes. 

Um dia, a mulher muito rica morreu. Como não tinha criados, o seu corpo pôs-se a putrificar até que o fedor horroroso se tornou incómodo. Encontraram-na em pé, no meio da sua enorme sala de estar, com o braço estendido, a clamar por ajuda.

Depois do enterro, os parentes da mulher lançaram-se aos seus afazeres, sem luto, sem choro, diga-se, com seus juízos de igual modo enegrecidos.

Aconteceu que o espírito da mulher não encontrou paz e, por isso, ficou a deambular, errante, pela aldeia. Doía-lhe, em especial, o facto de não ter deixado herdeiros. Assim, nos dias que se seguiram, passou a assombrar a sobrinha, a doce menina, aparecendo-lhe,

em momentos vários

de dia ou de noite

por trás dos cortinados. Depois, intrometeu-se, também, no sono da rapariga, mostrando-lhe a casa e um cofre secreto onde, em vida, guardava a sua fortuna.

Eu vejo a tia, disse um dia a menina, em ignorância das coisas da morte. E repetiu até que lhe prestaram atenção.

Levaram-na então para um curandeiro, que também interpretava sonhos e falava com defuntos. Invocado o espírito da mulher, ficou-se a saber qual era a sua intenção: deixava a sua propriedade e toda a sua fortuna para a menina.

Mudaram-se, os parentes mais próximos e os mais pobres, para a casa da falecida. E ficaram então loucos. Tanta era a fortuna, que mataram a menina para que pudessem, entre eles, dividir o espólio.

Sentindo-se culpada pelo acontecido, o espírito da mulher rica ficou outra vez sem paz. A mansão nunca mais foi habitada. De longe,

é possível ver dois vultos por trás das cortinas.

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