Textos de Renée Vidal
Enterro
Confundi o nada
com o tudo
E vivo permanente
nesta angústia
onde
se nada é tudo
então que seja a astúcia do tudo
a esconder
a audácia do nada
E se nada
é mesmo tudo…
então os que tudo
têm em comum
que paguem pelos pecados
dos que nada
têm em comunhão
Afinal… o enterro
é da morte do nada
que afinal
não é tudo…
*
Aniversário do filho da lua
Na aldeia das tradições
Muloji vui
a sereia nua
e já não atravessou mbora o rio
Kinganji perdeu
o n’goma
e ficou mbora na mata
Ditebo adormeceu
mbora bem bêbado
mesmo a porta da aldeia
Dikixi dormiu
com ngandu
e bebeu mbora a água do esquecimento
Kimbanda bebeu
do próprio milongo
e esqueceu mbora o caminho
Calunga até veio
mas foi mbora engolido
por m’boma…
Ò lua …
foste mbora a única!

*
Peça de teatro
Na aldeia do soba grande
No palco
os actores são lobos
na pele de cordeiros
representam uma fábula Africana
A estória
de um reino
que na lua cheia
os leitos de seus rios
inundam- se de pedras preciosas
e os lobos são incumbidos
por forças espirituais
para distribuírem as riquezas
pelos súbditos do reino
Nos último acto da peça
os lobos despem-se da pele de cordeiros
devoram os súbditos
e apoderaram -se das riquezas do reino
Na plateia
os espectadores são homens ignorantes
quê
não percebendo a metáfora
batem palmas
Os lobos agradecem
nãos as palmas
mas a ignorância dos homens.
***
Renée Mussenga Vidal Nasceu a 31-08-1974 numa aldeia do município do Negage, província do Uíge (Cangundo). Vem para Portugal com o pai em 1989 com 14 anos, onde conclui o ensino secundário. Em 2008 entra para a faculdade de direito de Lisboa, frequentando um ano. Enquanto ator, inicia-se no teatro em 2009 e estreia-se profissionalmente em 2011 com a peça “Recordações de uma revolução” de Heiner Muller numa adaptação e encenação de Mónica Calle, e a peça é aclamada com o prémio “ Melhor peça do Ano”. “Ecos no Silêncio”, escrito em 2004 é o primeiro de 6 obras compiladas. O primeiro trabalho literário a ser editado.