Ofereçam-me flores

A vida é mesmo um sopro, um dia acordamos e sorrimos, outro dia calamos para sempre. É preciso, ainda que dentro das nossas imperfeições, aproveitar a cada momento parar sorrir. O adeus acontece a cada instante, sem pré-avisos e dentro dos imprevistos possíveis.  

Os corações são também residências, é preciso limpá-los para permitir uma boa estadia àqueles que lá vivem. O perdão é um dos melhores instrumentos de limpeza que Deus nos deu. 
E não se trata de perdoar aos outros. É para perdoarmo-nos a nós mesmos. Talvez pelo facto de não sermos perfeitos o suficiente, por não conseguirmos viver como seres frágeis e amáveis que somos, por não conseguirmos dizer bom dia, por não conseguirmos caminhar juntos, por não nos respeitarmos, por invejarmos aos outros, por digladiarmo-nos, por não sermos humanos o suficiente para compreender a grandeza e dádiva desse maior bem que é a vida, por sermos fracos, por não conseguirmos pedir perdão.E é preciso errar. Errar humaniza-nos, faz-nos acreditar que somos seres que vivem e experimentam coisas, que partilham emoções, espaços, memórias, trajectos, tristezas, frustrações. 


É preciso errar porque nos faz sentir o orgulho de nós mesmos quando acertamos. Não é desvalorizar a inteligência, mas é o caminho que alimenta o pensamento. Errar é e deve continuar a ser típico da humanidade. Errar faz-nos acreditar que é possível, só precisamos continuar a tentar, a ir atrás, a sonhar…Precisamos aprender a perdoar os que erram connosco. A vida é mesmo uma linha muito ténue, qualquer dia rebenta e não mais estamos aqui. “A vida é um constante morrer”, dizia um poeta.
Ofereçam-me flores em vida. Quero cheirá-las enquanto posso, quero sentir o seu aroma, não interessa se foram compradas ou não, se foram arrancadas de um cemitério ou não, se alguém as arranjou num mato qualquer. Também não interessa se será numa barraca a solver uns copos de cerveja, numa esquina dos prazeres da vida, numa biblioteca de intelectuais, ou ainda na cama do hospital lutando pela vida. 
Ofereçam-me flores em vida, porque eu quero sentir o gosto de ser amado, esse prazer de ser homenageado em vida, esse humanismo que existe nas pessoas que dizem amarem-me, quero sentir-me querido, quero sentir esse embrulho no estômago. Não precisam ser muitos ramos. Um, dois, três… sentimento desconhece números.
Ofereçam-me flores ainda em vida. Quero pousar nelas como uma abelha, exibi-las, colar o cheiro delas em meu corpo, colocá-las num vazo, regá-las com a água da esperança que alimenta essa chama em mim, esse desejo de me manter vivo. Ainda que com os meus erros, ofereçam-me flores, porque elas são leves e aliviam as dores da alma. Ofereçam-me flores ainda vivo, porque quando morto não poderei mais as sentir.

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