Irresponsavelmente?

Por Inocêncio Albino

Costumava brincar com a primeira palavra deste texto, tentando fazer um anagrama. Porém, só conseguia gerar duas frases, com sentidos distintos e, até certo ponto, contrários: Ir responsavelmente e Mente irresponsável.

Na verdade, até estimaria se houvesse uma terceira possibilidade. Mas a aldeia em que o mundo se transformou barateara uma série de processos, dentre os quais os meios de transporte e comunicação, elevando, desta forma e a escala planetária, o sentido cidadão das pessoas. Por isso, com um alto caudal de informação qualificada, as pessoas, que progressivamente se transformavam em atores sociais ou agentes da ação, não mais admitiam uma série de atrocidades protagonizadas – em nome do consumo e do consumismo – contra o meio ambiente e, por tabela, contra a pessoa humana.

É vero que, durante centenas de anos, foi através da cultura do consumo que, fazendo do homem um escravo do vício do consumismo, qual cultura predatória, essa indústria rechaçou um conjunto de valores orientados para a preservação das partes interdependentes da terra. Em virtude disso, hoje a discussão sobre as mudanças climáticas jamais é feita para salvaguardar as gerações vindouras – afinal, nós mesmos somos uma geração em extremo perigo.

Fruto do consumismo exacerbado, muitos de nós sabem que se assassinam pessoas com albinismo em nome da crença de que seus órgãos valem uma fartura. Há dias ouvi dizer que se está tolher o direito de ir e vir das pessoas calvas – pela mesma razão. Calvícies que valem milhões! Assim, no linguajar popular, os calvos e os albinos são uma ‘bolada’. Ora, se eu sou capaz de degolar a cabeça de um semelhante – calvo ou sofrendo de falta de pigmentação – acham que, em nome da biodiversidade, seria capaz de respeitar a um elefante? Se, pelo menos, buscasse algum entendimento sobre sua função ecológica!

Assim, pensar e agir no contexto do binómio Mente irresponsável e Ir responsavelmente inspirados na palavra em epígrafe, é prática decisiva para quem, de facto, longe de qualquer teatro farisaico, pretende ir responsavelmente atraindo seguidores responsáveis. Não devemos nos manter indiferentes.

A mim nem apraz escrever isso, mas o quotidiano testemunha que nós os moçambicanos somos dos povos mais pobres do mundo; dos piores lugares para se ser mulher, criança, idoso e – sem descurar a dura carapaça da corrupção de que estamos revestidos – somos também dos mais vulneráveis territórios às mudanças climáticas. Nossa pobreza pode explicar, por exemplo, o facto de precisando, para o ano de 2017, de 200 milhões de dólares americanos para a mitigação dos efeitos das transformações climáticas, termos orçamentado apenas 70.

Recobrando na linha do tempo da nossa memória, é fácil visualizar – num passado muito recente – toda a região a sul do Save fustigada pela seca. Sem citar a manifesta falta de água na capital Maputo que, em Outubro passado, foi flagelada por uma tempestade que ceifou vidas e bens materiais. Ah… vale lembrar! Em Fevereiro recente, Dineo, o ciclone, eliminou sete pessoas, gerou dezenas de feridos e desabrigou cerca de 130 mil em Inhambane. Portanto, para a reconstrução, há muito trabalho a ser feito.

É animador, no entanto, perceber que votada a transformar este cenário, a Comunicação, alicerce de todos os processos, está a trabalhar para instaurar uma nova cultura. Ainda que de forma ténue, fazendo face ao Consumismo, essa cultura está gerando frutos animadores. Chama-se Responsabilidade Social!

Procuram-se adeptos e seguires fiéis que, longe de um teatro de fingimento buscando unicamente a autopromoção, inspirados pelo sentido de responsabilidade, comecem a desenvolver uma motivação que compra as causas sociais da nossa terra, como insumos da gestão estratégica das suas corporações para a construção de cidades melhoradas. Só assim, iremos parar esquiar na brincadeira que inicia esse texto, optando, finalmente, em Ir responsavelmente.

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