LEGADO DE ALMEIDA EM EXPOSIÇÃO

Paulo Jorge de Almeida
Nos anos 80, num período tenso por causa da guerra civil que vigorava em Moçambique e punha em combate as forças governamentais e a RENAMO, Jorge Almeida, um jovem fotógrafo, carregando a sua máquina fotográfica fazia a difícil travessia Pemba-Ilha de Moçambique. Entre tiros, gritos e o medo que a guerra causava, Almeida não parava, pois tinha uma missão: retractar a ilha de Moçambique. Passado mais de 20 anos, é feita uma exposição póstuma, no Centro Cultural Franco-Moçambicano (CCFM), em sua homenagem, denominada “a Ilha de Jorge”.


 
 Paulo Jorge de Almeida

Jorge Almeida o aventureiro

Jorge Almeida era um aventureiro apaixonado pela arte de fotografar, como o filho, Paulo Jorge de Almeida, confirma. Desbravava lugares ímpares procurando captar as melhores imagens. A esposa de Almeida, Maria Emília Luís Francisco Almeida, refere que “não podia acompanhar todas as suas viagens, mas quando ele voltava bebia parte das experiências dele através das fotos. Apreciava ajudá-lo a arrumar as fotos”.

Quando meu pai voltava das viagens, ele me fazia viver as jornadas que percorreu. Ele contava as histórias, os detalhes dos locais por onde passava. Nas fotografias, via lugares novos”, lembra Paulo.

Maria Emília conta que Almeida não encarrava as fotografias apenas como profissão: “a fotografia era a sua vida. Ele era apaixonado pelo que fazia. As fotos a preto e branco eram a sua marca”.

Paulo não sente saudades apenas do fotógrafo, mas do companheiro. “Meu pai era meu companheiro. Fazíamos corridas de carros juntos. Fotografávamos paisagens, conhecíamos locais novos”, lembra com ternura.

Jorge Almeida dedicou sua vida à fotografia. Começou a trabalhar na área em 1964. Foi sócio fundador e secretário-geral da associação moçambicana de Fotografia, entre 1984-1985, e fundador da Alpha Cooperativa de Fotografia, a primeira associação cooperativa privada a prestar serviços fotográficos em Moçambique. Por gosto próprio, fotografava espectáculos e tem 1200 originais em suporte digital e analógico.

A partida do professor e mestre

Além de captar as imagens com sua máquina, Almeida tinha um gosto especial por ensinar a fotografar. “Meu pai gostava de transmitir o que sabia aos outros. Dava aulas na associação Moçambicana de Fotografia, até o dia da sua Morte”, relata Paulo.

Com uma voz trémula, falando aos soluços, segurando um papel e as lágrimas, a fotógrafa e curadora, Yassmin Forte, contou na apresentação da exposição que Almeida para si foi um mestre, professor e mentor. “Tudo que sei de fotografia devo a Almeida. Ele tornou-me a fotógrafa que hoje sou”.

Almeida morreu no ano de 2013, deixando um vazio na fotografia nacional e seus parentes e amigos aos prantos. “Ele partiu de forma inesperada. No dia da sua partida, ele estava feliz, seguiu a sua rotina diária, arrumou seus material de trabalho e foi ao centro onde dava aulas. A notícia da sua morte por parada cardíaca foi recebida com dor e pranto”, lembra a esposa de Almeida.

“Ilha do Jorge”, uma dedicatória póstuma

Depois da morte de Jorge Almeida, os trabalhos ficaram conservados em sua casa, na posse da sua família. Como forma de prestar homenagem ao fotógrafo, amigo e colaborador que foi Almeida, o CCFM, em parceria com o FUNDAC, e com o contributo de Yassmin Forte e Filipe Branquinho como curadores, organizaram a exposição a Ilha de Almeida.

A materialização da Mostra só foi possível graças à intervenção da família e dos amigos de Almeida.“Tenho um sentimento de gratidão aos amigos e ao Franco pela iniciativa. A exposição é fruto do sentimento de amizade e apresso ao trabalho de Almeida. A mostra é uma forma de conservar o legado do Jorge”, enalteceu a iniciativa, Maria Emília.

A fotógrafa Yassmin Forte foi uma das curadoras da exposição e sentiu na pele o prazer e peso de organizar uma exposição. “Existe um trabalho por trás desta exposição, a preparação das fotos, a organização a firmação de parceira, entre outros passos”, disse Yassmin.

A exposição tem um dedo de Paulo, ele fez a selecção das fotos. “Foi uma experiência muito boa. Eram mais de 6000 fotos e algumas estavam repetidas, tive de escolher as melhores. Confesso, todas eram boas. Nas fotos seleccionou-se a diversidade”.

O olhar de Almeida a Ilha de Moçambique

Jorge Almeida participou em diversas exposições, de salientar o primeira grande exposição Ilfoird que viajou pelo país, o 1º salão de artes fotográficas, ainda a exposição individual, Pemba Terra Macua.

Este fotógrafo tinha uma admiração particular pela Ilha de Moçambique, e dedicou seu tempo para fotografar a alma desta ilha.“A exposição traz o olhar de Almeida à Ilha de Moçambique a preto e branco. A forma como este fotógrafo reparava para esta ilha”, disse Yassmin.

Na exposição A ilha do Jorge, nas paredes encontramos 22 foto-paisagens e 11 foto-retractos. “Ele fotografava os detalhes da ilha. Em cada foto da exposição, dá para perceber que ele captava momentos únicos. Nas fotos, dá para conhecer as vivências, as características da ilha de Moçambique: a dança, a religião, os hábitos e costumes”, esclareceu Paulo.

No seu trabalho fotográfico, Jorge Almeida retractou a Ilha de Moçambique na sua plenitude. A religião, a cultura (as danças, e ritos desta ilha), as actividades económicas (pesca), ao locais históricos, as mulheres, enfim. O dia-a-dia da Ilha foi captado pelas lentes da máquina fotográfica de Jorge aos retractos da exposição.

Legado de Almeida

Paulo segue as pegadas do pai. Com um estilo diferente, mas com aquela veia de fotógrafo transmitida pelo pai. “Aprendi a fotografar com meu pai aos 6 ou 7 anos. No início, usava uma daquelas máquinas descartáveis, mas agora tenho uma máquina digital profissional. Não segui a linhagem do meu pai, as fotografias a preto e branco, agora estamos noutra era cheia de cor. Gosto de fotografar paisagem, a natureza”, afirma Paulo.

Depois da morte de Almeida, ficou um espaço, um vazio no cenário fotográfico nacional. “Necessitamos de alguém para dar continuidade ao trabalho de meu pai”, conclui Paulo.

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