Estrelas no meio do caminho

Por: Pedro Pereira Lopes

Decidi celebrar o meu novo livro com uma viagem de carro à cidade de Inhambane. Levava, na boleia, um amigo e o escritor galego João Guisan, que visitava Moçambique. Jornada nocturna e de receios. Era a minha primeira longa viagem, desde que me vira condutor, de modo que era novidade também para mim. Depois de Inharrime, o volante passou para as mãos do João. Íamos de olhos colados às bermas da estrada, apreensivos porque o mostrador do combustível estava baixo, e podíamos ficar perdidos e sozinhos, dentro do estômago da escuridão. Num impulso, o João conteve a velocidade e silenciou a besta.

Quero ver as estrelas, disse, olhando-me com um sorriso de europeu achado num safári qualquer.

Estrelas, perguntei, abrindo a porta do carro. Não há estrelas na Europa? Eu sabia que estava a ser idiota.

Saímos os três. No céu, as estrelas, alheias aos nossos olhos, faziam o espectáculo. Eu não me lembrava de tê-las visto em tal condição, tão vivas, com incrível chama. É porque aqui há escassa iluminação e zero de poluição, pensei. E pareciam imersas numa poeira azulina também luzente, pequenas lagoas. O João, num sorriso de astrónomo, reconhecia, pelo dedo, as constelações como quem chamava figuras de estilo:

Cão maior, unicórnio, centauro…, prosseguia, numa voz engodada.

Há sempre estrelas no meio do caminho. Só nos esquecemos, quiçá, da sensibilidade para apreciá-las, conclui eu, contente dentro da minha palermice.

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