Lovely Dificult Residência de quem vai embora

O álbum Lovely Dificult (2013) da cabo verdiana Mayra Andrade é um aceno forte para a rota mainstream da World music. Uma aventura perigosa que implicou a absorção de vários géneros musicais para construir um genuíno que, não obstante, congrega os ritmos da sua terra.

20120121_BKP501Os instrumentos cabo verdianos uniram-se para um conceito novo, mas é evidente um fraseado próximo da música pop.
Sob ponto de vista estético, nota-se alguns traços significativos do experimentalismo, música clássica, jazz, neo soul e as suas normas, aquecidas por um blues.
As composições da intérprete e vocalista da Ilha de São Tiago, radicada em Paris, têm muito de si mesma, são letras autobiográficas, talvez por isso a sua voz soe naturalmente.
Há que se reconhecer a sua disciplina na colocação desta mesma voz, com uma elegância impecável. O repertório é composto por músicas estudadas ao detalhe, cada elemento, cada instrumento, melodia. Não deixa sem dúvida de ser uma aula.
Mayra-Andrade-01Na sua actuação em Maputo, na edição do Festival Azgo 2015, conquistou um público que se quer conhecia o seu trabalho. A sua espontaneidade arrebatou a plateia que na terceira música já aplaudia em apoteose, encantada.
Para além de vocalista Mayra Andrade também toca guitarra que acusa o ponto mais alto na música “Meu farol” que dedicou a sua mãe. Nela, com poesia pinta as suas dores pela saudade que sente.
Há nela uma frescura e melodias da brisa do mar. Uma sonoridade fresca que lembra os assobios das ondas batendo na areia branca.

Confira o vídeo de Mayra Andrade

A percussão, instrumento que hoje nas nossas proximidades é conduzido por monstros como Samito Tembe e Tlale Makhene, transcende e é explorada até pelos acordes das guitarras acústicas.
Romântica e urbana de cidades cultas que bem conhece, a música de Mayra Andrade sabe a vinho e paladar de … isso na música “We used to calls it love”.
O baixo imponente em “Build it up”, com evidências que se assemelham a dicção da Rihanna do princípio da carreira e, em parte, uma certa ousadia da Beyoncé, em geral da malta pop. O instrumento cobre com fluidez os espaços que a voz falta e assim vai até ao final.

Escute Lua do álbum Navega (2006)

Na faixa “Ilha de São Tiago” faz uma saudação a sua terra, obedecendo os valores ditos africanos, que são os de respeitar a sua mãe, sua terra, sua alma, a essência de si.
“Le jour se leve”, se eu entendesse de música, diria que é um balé com elementos asiáticos que termina num ritmo muito africano e chique, sempre cheia de requinte.
Em cada faixa vai justificando o título de herdeira da diva dos pés descalços, Cesária Evóra. Ah, sodade. Este álbum é o quintal de Mayra Andrade, onde estão a florir rosas coloridas porém regadas de lágrimas de saudades.
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A viagem prossegue para uma terra longe cujo horizonte é colorido por cores animadas de esperança e saudades com as quais pinta as paisagens que oferta à música. Este álbum é um confessionário, palco de lamúrias, embora às vezes revestido de alegria que é só simpatia.

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