Num país onde o talento é abundante, mas as oportunidades escassas, qualquer gesto que coloque os artistas no centro da acção social merece ser celebrado e analisado com seriedade. O programa Ready For Art, lançado pelo Absa Bank Moçambique, é um desses gestos. Mais do que uma iniciativa de responsabilidade social corporativa, a acção é uma proposta estrutural para uma nova forma de pensar a arte, a inclusão e o território.
Há algo de revolucionário, ainda que subtil, em transformar balcões bancários em galerias. Espaços antes dedicados exclusivamente à movimentação financeira passam agora a acolher olhares, gestos e questionamentos visuais. Este é um acto de reconversão simbólica e, acima de tudo, de coragem institucional. Porque confiar aos artistas o papel de contar histórias num ambiente tradicionalmente conservador não é apenas uma opção estética é uma tomada de posição.
O que Ready For Art traz à superfície é a capacidade da arte de funcionar como espelho e bússola. Nas obras de Mohssina Ganesh, António Guimarães, Hotélio Ernesto ou Madamudje Marqueza, encontramos fragmentos de um país que sonha, sofre, persiste e cria. São vozes que, muitas vezes, só ecoavam em círculos fechados e agora encontram um público mais vasto e inesperado. Clientes de banco, funcionários, autoridades, jovens curiosos, todos chamados a observar, parar, reflectir.
Mais do que exposições, este é um programa de capacitação e dignificação. Os artistas não são apenas convidados a expor: são preparados, escutados, integrados num percurso que vai da formação à visibilidade. E isso faz toda a diferença. O Ready For Art é um espaço de criação de futuro, não de caridade simbólica.
E há outro aspecto notável: a descentralização. Ao levar as exposições para a Beira e Nampula, o programa rasga um mapa mais justo da cultura moçambicana. Sai-se da zona de conforto da capital para activar os nervos criativos do centro e do norte, onde há tanto talento quanto necessidade de plataformas. Num país onde os desequilíbrios territoriais são gritantes, este gesto tem peso político, e poético.
Claro, é cedo para declarar vitórias definitivas. O sector artístico ainda carece de políticas públicas consistentes, espaços de exibição contínuos e mercados sustentáveis. Mas o que Ready For Art oferece é um modelo: uma demonstração prática de que investir na cultura não é um capricho, mas uma estratégia de desenvolvimento. Uma aposta de futuro.
Numa era em que as instituições procuram relevância social para além dos lucros, o exemplo do Absa é refrescante. E necessário. Mostra que há espaço e responsabilidade, para o sector privado tornar-se cúmplice da transformação cultural. Que a arte pode viver para além dos museus, nas ruas, nas montras, nas vidas quotidianas.
Ready For Art é, em última instância, um lembrete de que a arte não acontece só onde há palco. Acontece onde há vontade. E, neste caso, essa vontade começa num banco. E chega a todo um país.