Nas proximidades do Mercado Central, próximo ao antigo Restaurante Ponto Final, está um antigo estúdio fotográfico, na cidade de Inhambane. Foi ali que, na alvorada da década de 90, se registou uma fotografia a preto e branco dos meus pais. Essa imagem, guardada num álbum impresso e conservada com carinho pela minha mãe, faz parte de uma tradição familiar que muitos ainda preservam. As fotografias da época, com sua estética focada na emoção dos modelos, servem hoje como um ponto de partida para entender os rostos que Maria Chale retrata nas suas pinturas.
Na exposição patente na Fundação Fernando Leite Couto, Maria Chale captura, através da aguarela acrílica sobre papel, as gentes com quem esbarramos no quotidiano. Tal como nas antigas fotografias de estúdio, os seus retratos transcendem a precisão anatómica, focando-se no semblante e no estado de espírito dos retratados. É nessa busca pela essência emocional que encontramos um diálogo entre o passado e o presente.
Contudo, o trabalho de Maria Chale distancia-se das narrativas optimistas do afrofuturismo. Em obras como ‘Patrulha’ ou ‘Mata-bicho’, a artista apresenta um futuro pessimista, onde os retratados parecem agir ‘a reboque’ das circunstâncias. O título da exposição, ‘Agente da Passiva’, sugere uma reflexão sobre a passividade e a falta de controlo perante o destino.
Noutra secção, ‘Impressões’ revela uma abordagem mais abstracta, onde a tinta escorre sobre a madeira como cores de aura, convidando a leituras holísticas e espirituais. Esta dualidade entre o figurativo e o abstracto revela uma artista introspectiva, atenta ao seu redor e às complexidades da existência humana.
Maria Chale, licenciada em Arquitectura e Planeamento Físico pela Universidade Eduardo Mondlane, apresenta na sua terceira exposição individual um trabalho que desafia as convenções e convida o espectador a reflectir sobre o passado, o presente e o futuro. Através da sua pintura, ela não só captura o imaginário colectivo, mas também questiona o nosso lugar no mundo.”
