Estamos no interior da Fortaleza São Tiago Maior, na Cidade de Tete, centro do país. As marcas de secura devido ao calor abrasador são indisfarçáveis. As paredes rochosas e o piso argiloso do pátio, que se mantêm há séculos, parecem contar histórias de outros tempos.


O local serve de base da Casa Provincial da Cultura de Tete, agremiação que representa os interesses dos artistas ao nível da Cidade e Província dos “6C’s”. Situado nas margens do Grande Rio, o espaço ostenta um ambiente sereno, onde também se pode assistir à concepção, ao ar livre, da arte N’yunguè, conhecida pela escultura feita à imagem da riqueza natural de que a região dispõe.


Aqui, também se encontra a base da Associação Provincial dos Poetas de Tete (APPT) onde somos recebidos para uma conversa.


Entre apertos e privações conjunturais


Surgiu em 2019 como uma alternativa para a quase inexistente representação da Associação dos Escritores Moçambicanos em Tete. A APPT dedica-se, actualmente, à dinamização de eventos performativos, encontros de reflexão e outras acções de engajamento e incentivo à leitura e escrita, com o objectivo de fazer de Tete uma referência da poesia em Moçambique.


“A ideia surgiu de sucessivas tentativas de revitalizar a Associação Provincial dos Escritos de Tete. A ideia era, sobretudo, tornar a expressão poética mais activa dentro da Associação [Provincial] dos Escritores. Infelizmente, não foi possível”, recorda Elísio Franque, membro-fundador da APPT.


Os primeiros anos, narra, a APPT trabalhou no silêncio, focada nem materializar-se. Entre as privações da pandemia do novo coronavírus que assolou o país e outros apertos conjunturais, juntou os primeiros membros, traçou metas, ganhou vida e assumiu o compromisso de amplificar vozes dos cultores da palavra, em Tete.


“Não foi possível trazer à tona o que queríamos fazer, na altura (2019). Tivemos que começar a correr atrás de pessoas ideais para dar vida à ideia e organizamos a casa, até que houve o relaxamento”, conta, a destacar que a pandemia foi o momento de partilha de consolidação da ideia de que a APPT devia, de facto, existir.


Com o relaxamento das medidas restritivas face à pandemia, veio a abertura do país e das actividades culturais para o desabrochar. Para dar a conhecer as suas intenções, a APPT organizou, em 2022, o seu primeiro evento de sempre.
“Organizamos o primeiro SARAU Cultural, que foi uma Roda de Poesia Acústica a Volta da Fogueira e tornamos isto uma marca na Cidade de Tete, para não dizer província. Também criamos um Recital. A princípio, para a leitura e interpretação de obras literárias de escritores daqui de casa”, lembra Elísio Franque.


A primeira experiência de recital foi “A Sereia do Zambeze”, a primeira obra de Franklin Gravata. “Ficou também esta marca e entendemos que era fundamental que estes livros pudessem ser lidos e interpretados em palco, para que se possa compreender o que os mesmos trazem como arte, cultura e história. E isto é parte de nós”, acrescenta o responsável.


Com ousadia, a APPT estruturou-se e passou a se fazer representar em alguns distritos de Tete, em cumprimento de um dos sonhos na sua fundação. Fez do SARAU Cultural um evento anual, estabeleceu parcerias e deu lugar a lançamentos de autores locais. No entanto, os desafios prevalecem.


“Não basta ter ideias claras e sonhos. Há movimentos no meio disto. E são movimentos dispendiosos que nos impedem de criar e manter uma rotina dinâmica que estenda os nossos planos para os distritos onde temos representação”, conclui Elísio Franque.