Poemas de José Inácio Vieira de Melo

Textos de José Inácio Vieira de Melo

A CATEDRAL DO NOME

Nem a tinta dos sete mares
seria suficiente para pintar a tua face.

O sentido da tua face
nenhum espelho concentra.

Somente aquela singularidade provisória
pode perenizar a verdade de teu semblante.

E essa face de que me recordo
deixou no espaço e nesta tarde
um imenso vazio.

Porque tudo isso só faz sentido
se houver a tua presença
sendo abraçada pelo meu espanto.

Como inventar uma borboleta
sem o teu sorriso?

Como sonhar com o Paraíso sem ti,
erva do meu chá, Eva do meu chão?

Mesmo que um arco-íris se ajoelhe
e ofereça seu dorso para que o cavalgue
nas dissonâncias da partitura cósmica,

não vai ter lógica a ser ultrapassada
se minhas retinas estiveram trespassadas
pela tua ausência.

E no céu da minha nação
não há juventude nem sabedoria
se não houver tua companhia.

O outro que és é o longe
que se alonga ao meu encontro.

Pintura de João Timane
Pintura de João Timane

PRIMAVERA NA CAATINGA

Tudo ver e se erguer
dentro de uma canção
com cheiro de vida,
alegria de pássaro
que voa na caatinga.

Agora e sempre
é tempo de semear belezas,
flores de angicos,
cheiro de umburanas.

Estou sempre lutando,
por sorrisos presentes
que façam ecoar
poesia entre os dentes.

Tudo me impele
ao próximo.

Pintura de João Timane
Pintura de João Timane

O MUNDO FOI FEITO PRA GENTE ANDAR

O mundo foi feito pra gente andar.
Então, vai: um passo depois do outro.

Vai descobrir os caminhos que te levarão ao outro.
Vai inventar uma história, vai fazer a história.

O firmamento é o ponto de partida
para a tua caminhada cósmica.

E cada seixo da estrada impulsiona o teu passo
para uma estrela, para um novo espaço.

Sim, o mundo foi feito pra gente andar
e o que guia teu sapato não é o norte magnético
nem o canto das cigarras nem o caminho das formigas.

É sim algo que formiga no teu juízo
e se entranha e se amalgama e se harmoniza sem parar.

Sim, o mundo foi feito pra gente andar,
pra gente se descobrir e se inventar e se reinventar.

E por mais que se percorra mundos,
por mais longe que se chegue,
não haverá chegada, não haverá,
porque o mundo foi feito pra gente andar.

***

José Inácio Vieira de Melo​ (1968), alagoano radicado na Bahia, é poeta, jornalista e produtor cultural. Publicou oito livros de poemas, dentre eles Sete (2015) e Entre a estrada e a estrela (2017). Publicou também as antologias 50 poemas escolhidos pelo autor (2011) e O galope de Ulisses (2014). Organizou três antologias com poetas baianos e participa de diversas antologias no Brasil e no exterior. Coordenador e curador de vários eventos literários, como a Praça de Poesia e Cordel, na 9ª, 10ª e 11ª  Bienal do Livro da Bahia (2009, 2011, 2013), e a Flipelô – Festa Literária Internacional do Pelourinho (2017, 2018, 2019). É convidado, com frequência, para vários eventos por todo o Brasil e no exterior. Em 2018, esteve na Cidade do México, a participar do VIII Festival de Poesía Las Lenguas da América, representado o Brasil e os países de Língua Portuguesa, e em Cartagena das Índias, na Colombia, onde participou dos festivais de poesia XXII Festival de Poesía de Cartagena e Sílaba de Agua – Fiesta de la Palabra y las Artes. Em 2020, participou do XXVIII Festival Internacional de Poesía de Bogotá e do XIII PoeMaRío – Festival Internacional de Poesía en el Caribe, em Barranquilla, Colombia. Dentre os prêmios conquistados, destacam-se o Prêmio O Capital 2005, com o livro A terceira Romaria, e o Prêmio QUEM 2015, na categoria Literatura – Melhor Autor, com o livro Sete. Tem poemas traduzidos para alemão, árabe, espanhol, finlandês, francês, inglês e italiano.

Leave a Comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Scroll to Top