LUA-DE-MEL DE EMERGÊNCIA

Escrito por Elcídio Bila

Fechou a porta e uma lágrima, rolando feito um pneu num asfalto embriagado, denunciou-lhe o nó apertado na garganta.

 O que se passa?

– Há oito anos que não passamos um dia sequer sem as crianças. Não é fácil vê-las partir. E o pior, sem poder lhes dar um abraço.

– Eu sei amor, mas a tua mãe lhes ama muito e vai cuidar muito bem deles.

Seguiram de mãos dadas para o sofá e olharam para a televisão ainda com tertúlias de bonecos na tela.

– Desliga isso, só vejo eles aqui. É muita dor

Marito cumpriu a vontade da esposa sem mais prolongar assunto. E fez mais: afastou do seu olhar intrigante todos os brinquedos espalhados pela sala e outros vestígios que pudessem deixá-la aos prantos.

Voltou a ela com ares de enfermeiro:

– Deixa ver a tua ferida.

Disse o Dr. Mário, ou apenas ansiando ser, espreitando por de trás da ligadura e apreciando outras escoriações na testa, no nariz, no braço e nas pernas… bom, quando chegou nas pernas, onde só haviam algumas raspadinhas, talvez no momento que tombou, o jovem demorou-se. Ali ficou imóvel, quase que inanimado. Ele passava a mão naqueles traços inventados pelos estilhaços do telemóvel, era como se tentasse descobrir as diretrizes do paraíso naquele formato de mapa criado pelo incidente. Subia e descia devagar, por vezes girava como se estivesse numa rotunda apertada. A cada movimento, a mão ficava mais trémula e arrepiante. Foi de uma delicadeza tal, que Maria não se conteve:

– Venha mais para cima.

Era mesmo o que o sujeito queria ouvir. Investiu tanto naqueles gestos efervescentes para que ela se rendesse e accionasse a luz-verde, tal um semáforo que alivia o trânsito.

Sobre a capulana, a mesma que ganhou no dia da mulher, os dedos de Marito enfrentaram a montanha e foram subindo – um exercício de alpinismo extremamente delicado e feito com todas as cautelas. Já no cume da montanha, Marito deparou-se com uma realidade que desconhecia: ela não trazia mais nada sobre a capulana, para além de um fogo cada vez mais ardente.

Naquele instante, ela apertou o tronco do marido com toda as forças, as dela e de todos os seus espíritos, e puxou-lhe junto dele, sem permitir que os dedos abandonassem o cume da montanha. Os seus lábios, mais pertos um do outro e cada vez mais audazes, trocaram de lugares, permitindo espaço doutro lado do rosto.

Maria tocava nos lábios do marido como se os desconhecesse e, naquele momento, quisesse descobrir os mistérios que os dez anos de casado, não se sabe porque infortúnio, não a permitiu. Enquanto o choque de lábios acontecia, numa transferência mágica de batom e outros artefactos, os dedos de Marito vestiam-se de (in)disciplina e começavam golpes certeiros no fundo da capulana. E não é o que o tecido incomodava a senhora! Afastou aquele pedaço de roupa para fora daquele jogral e permitiu que o marido não só visse a abundância com as mãos, bem como pudesse saciar a vista.

Ao olhar naquela beldade pomposa lembrou, finalmente, que tinha uma rainha em casa e que já algum tempo não se tinha dado conta de que ele é o rei. As contas e as outras têm esse poder de desviar do radar a pessoa que verdadeiramente conta, pensou e num suspiro profundo voltou a concentrar-se.

O homem, artisticamente, saiu dos lábios redondos e, devagar, escalou o pescoço da moça, o peito… ali levouuma eternidade. Aquelas duas laranjas, uma mais suculenta que a outra, não permitiam rapidez nenhuma. Entre as pontas e outras partes dos seios, Marito desfilava uma das suas mãos e engolia a sua boca. A outra mão, sempre competente, permanecia naquela zona de ebulição e não fraquejava. Mesmo quando o umbigo e outras partes da barriga fossem tomados pela sua língua, os dedos da destra mão permitiam bons e saborosos gemidos da amada. Os gemidos só subiram de tom quando a língua de Marito caiu perdida entre as pernas. Os dedos, esses, não cediam à intrusa. Os dois viveram naquele centro apocalíptico os melhores momentos daquele casamento que nos últimos dias entrava no poço do caos.

Foi aí que os pés de Maria, com o mesmo malabarismo de um acrobata, baixaram nos calções do marmanjo. Ele também não trazia mais tecido por dentro, por isso tudo ficou ali exposto, numa contemplação admirável por parte da esposa. Pegou no negócio e deu o melhor tratamento que um investidor de orgasmos pudera proporcionar. 

Caídos na cama, ofegantes, com rios de água pelo corpo, com os pés sobre o outro, assistidos pelo televisor, meia hora depois, Marito arriscou conversa. Só que foi ela que se apressou:

– Nunca tinha sentido o que senti hoje.

– Então é verdade o que contaste ao seu professor…

Ela emigrou para outros hemisférios, deixando apenas os seus olhos fixos no peito cheio do marido, correndo suor entre os pêlos levantados.

E ele decidiu ser mais assertivo:

– Que o teu amor por mim tinha murchado e que já não tinhas tesão

Continuou viajada, entre galáxias desconhecidas. Deu por si já estava de volta à terra e reconheceu:

– Sim. 

Depois de alguns segundos, para ela uma eternidade, concluiu, cabisbaixa:

– É verdade.

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